EDITORIAL

Armindo Veloso




 
Vergonha 

Um amigo meu dizia-me há dias: Sabes, o que mais me impressiona nele é que dificilmente passa numa rua qualquer ou entra num café sem se cruzar com um credor mas anda de cabeça levantada como se nada fosse. É incrível como o consegue.
Fomos falando os dois acerca de mais casos desses, porque há muitos, e, eu no fim resumi, e o meu amigo concordou, que só pode haver uma razão para as pessoas, os tais, agirem daquela maneira. Perderam a vergonha. Perderam a vergonha! E quando se perde a vergonha tudo o resto vem por acréscimo sem o mínimo de sacrifício.
Quando se perde a vergonha todas as outras características que fazem de nós pessoas com ‘P’ grande desaparecem.
Só com a perda total da vergonha se pode andar a desfilar em sociedade quando se levou à falência dezenas de pequenas empresas, credoras.
Só com a perda total da vergonha se pode desfilar bens materiais no valor de milhões se não se paga a tempo e horas aos colaboradores ou se se lhes faz a vida negra à espera que alguns desistam.
Só com a perda total da vergonha se carrega na cabeça em quem por infortúnio ficou em baixo quando esse mesmo era bajulado quando estava no alto.
Só com a perda total da vergonha se defende uma coisa e o seu contrário consoante se é do poder ou da oposição.
Outra forma de vergonha perdida: Num festival de tunas académicas a tuna que abriu o espectáculo foi a tuna oficial de uma grande academia. O porta-voz da dúzia e meia de estudantes, alguns com cara de quem tem uma dezena de matrículas..., logo no início da sua intervenção disse, a despropósito, uma verborreia de brejeirices que puseram em silencio as centenas de pessoas: colegas, pais, avós, professores, etc, ali presentes. As palavras utilizadas nem numa revista erótica podem ser reproduzidas. Fui claro?...
Se eu tiver razão ao dizer que  uma sociedade perdendo a vergonha vem tudo o resto, de mau, por acréscimo, não sei o que diga desta geração – para ser justo de uma parte dela - que é a nossa e fruto de nós. Futuro terá certamente. Mas, que futuro?

Até um dia destes.