Comemorou 100 anos dia 12 de Janeiro


Maria da Luz: princesa lá de casa

Maria da Luz de Carvalho come-mora, esta quinta-feira, dia 12 de Janeiro, 100 anos de vida. Reside no Caminho do Carvalhinho, precisamente no local onde nasceu há 100 anos atrás. A modesta habitação deu agora lugar a um bonita vivenda. Vive com a única filha, Maria Alice, e restantes familiares. Acarinhada por todos, é a princesa lá de casa e a “menina dos olhos” dos seus entes queridos. Com um brilho nos olhos, e emocionados, os seus familiares vão contando algumas das passagens da sua vida.
Mostrando uma enorme vontade em estar informada, Maria da Luz passa a “pente fino” tudo quanto é jornais e revistas, a fim de ficar a par dos vários assuntos. A sua leitura preferida são as várias cartas que vão chegando pelo correio. Há cerca de 15 anos atrás, as cataratas retiraram-lhe a visão mas uma operação realizada nos Hospitais de Coimbra voltou a dar luz aos seus belos olhos.
O seu espírito mantém-se jovem, acompanhando as várias mudanças que ocorreram na sociedade. Tem no pároco Luís Peixoto Fernandes o seu maior amigo, amizade que é retribuída pelo sacerdote. “Gosto muito dele”, refere Maria da Luz. E é por ele que a anciã vai participar na missa de Acção de Graças que é celebrada esta quinta-feira, dia 12, pelas 18 horas, na Igreja Paroquial de Garfe. Foi precisamente às 18 horas que Maria da Luz de Carvalho veio ao mundo.
Filha única não teve muito tempo para se dedicar às brincadeiras próprias das crianças. O pai, como aconteceu com muitos povoenses, emigrou para o Brasil e nunca mais voltou, deixando Maria da Luz, ainda de tenra idade, ao cuidado de sua mãe, Eufrásia de Matos. Juntas, lutaram pela vida, trabalhando “ao jornal e tecendo” como a própria afirma. Depois das peças tecidas, Maria da Luz ia a pé até Guimarães para as vendas e para ganhar uns trocos tão necessários para a sua vida. “Trabalhei sempre muito”, revela Maria da Luz. Os problemas de audição levam a que seja parca nas palavras para, como diz a sua neta, Maria da Luz, que partilha o nome com a avó, não cometer qualquer incorrecção.
Tal como a mãe, também Maria da Luz só teve uma única filha, Maria Alice. À filha, juntam-se cinco netos, oito bisnetos e dois trinetos. A vida de trabalho prosseguiu na idade adulta. O destino não lhe deu sossego e ficou viúva com a filha, de 9 anos, ao seu encargo. Nesta vida de trabalho, recebeu o apoio de sua mãe, assim como da sogra, que a considerava como uma filha. Sua mãe, Eufrásia de Matos, veio a falecer com 96 anos de idade, tendo estado durante cega cerca de 22 anos.

Autónoma nas várias tarefas
Todos os dias, três a quatro vezes por dia, Maria da Luz desce os 14 degraus das escadas, com a ajuda de uma bengala, desde o primeiro andar até ao rés-do-chão. Mesmo nessa tarefa, não gosta que a ajudem. Por volta das 9 horas, levanta-se e arruma a sua cama. Depois da higiene pessoal, desce até ao rés-do-chão para preparar o pequeno-almoço. “Gosta de ser ela a preparar o pequeno-almoço. Quando tentamos ajudar diz-nos que não é nenhum bebé”, revela a neta Maria da Luz. Briosa, gosta que lhe coloquem creme e não dispensa a manicure e a depilação.
Durante o dia, junto à varanda, vai acenando às pessoas que vão passando junto à habitação, cumprimento que é retribuído por quem ali passa. A sua perfeita visão permite-lhe reconhecer muitos dos conhecidos que por ali passam.
Com uma visão apurada, apenas a audição lhe vai pregando umas partidas e as conversas com a anciã têm que ser tidas em voz alta.
Lúcida, não esquece nenhum pormenor e vai recordando algumas das passagens da sua vida, uma vida de trabalho e luta. “Vieste de carro ou de avião? O pequenino já anda?”, questionou o bisneto Leandro, que se deslocou de França para assistir à festa de aniversário da sua bisavó.
“Come pela sua mão, lê todos os jornais que apanha e todas as cartas que chegam pelo correio. Tem que andar a par dos acontecimentos. Gosta de estar informada, pelo que temos que lhe contar tudo o que acontece”, recorda a neta, Maria da Luz, revelando que a avó é muito divertida e engraçada mas também “senhora do céu nariz”.
Antes de casar, com aquele que foi o seu único marido, Maria da Luz namorou um jovem da freguesia, oriundo de uma família com posses, que emigrou para o Brasil. A condição financeira foi um entrave ao namoro. Nunca mais se viram até que, há uns dez anos atrás, recebeu uma carta desse senhor, desde o Brasil. Estabelecido o contacto, todos os anos lhe enviava as boas-festas pelo correio, até há dois anos atrás, quando veio a falecer.

“A capela é nossa”
A disputa dos terrenos, junto à Senhora do Monte, entre as freguesias de Garfe e Gonça já vem de há muitos anos atrás. Nos seus tempos de criança, Maria da Liz e outros jovens de Garfe iam pastorear os animais para junto da antiga capela da Senhora do Monte.
“Era sempre lá um barulho. Eles diziam que era deles e nós dizíamos que era nossa. E é nossa. A capela é nossa, é daqui”, revela Maria da Luz.
Pegamo-nos, uma vez, ao barulho uns com os outros e eles (os de Gonça) foram chamar os pais deles. Nós dissemos que tanto vale vir os pais como não vir. A capela é nossa, está no que é nosso”, afirma ainda Maria da Luz.