EDITORIAL


Armindo Veloso
 

Cão com óculos

Vi na rua um cão com óculos que levava uma senhora pela trela.
Não, não troquei a ordem dos factores, uma senhora que põe óculos a um cão tem que aguentar que alguém lhe diga que está a ser conduzida pelo bicho.
Mas que raio de sociedade esta! Não fazemos filhos, não passamos cartão aos velhos e depois, carentes e frustrados, “vingamo-nos” nos animais. 
Quando era garoto, estudava em Braga e me mandavam à cantina da polícia - para quem não sabe era um pequeno supermercado onde os agentes e as suas gentes, depois de se identificarem com um cartão produzido para o efeito, tinham de tudo, o que havia ao tempo, mais barato do que o comum dos mortais - via, já nesse tempo, latinhas com comida para cão. Perguntava para os meus botões quem seria o louco, e rico, que compraria comida para os cães.
Mas que ingenuidade a minha, no mundo ocidental já fervilhava o consumismo e os estudiosos da matéria já vislumbravam que estava aí um negócio de milhões. Ei-lo!
Choramos as taxas moderadoras nos hospitais? Claro, elas têm algum jeito, devia ser tudo de borla!
Compramos comidinha para cão da melhor? Ó se não havia de comprar, é para o bem do bichinho!   
Quem sabe se o meu espanto acerca do cão com óculos não é também infundado. Se tivesse menos uns anitos fazia uma sociedade: “Fábrica de Óculos para Cães, Lda”.
Há milhares de milhões de pessoas em todo o mundo sem a mínima hipótese de tratar da vista?
O que é que isso interessa.
Vivam os óculos para cão!

Até um dia destes.