EDITORIAL


Armindo Veloso
 
Mesmo ao lado

“As coisas melhores e mais importantes da nossa vida não custam dinheiro”.
Esta frase foi-me dita por uma senhora da minha família que desempenha um lugar de destaque social e institucionalmente. Trata-se de uma pessoa que diz, e pratica, que não se deixou abraçar pelo ter mas sim pelo ser.
Sei que é muito fácil falar quando se tem o mínimo indispensável para se viver com toda a dignidade. É o caso. Não se pode comparar essas pessoas com quem vive um dia atrás do outro no fio da navalha financeiro.
No entanto, para o que interessa neste texto, a frase ficou-me. De facto, se pensarmos bem e nos abrirmos – é necessário estarmos permeáveis, como essa senhora está, para nos realizarmos com coisas simples e pequenas – a maioria das coisas importantes não custam, ou quase não custam, dinheiro.
Vivemos num mundo onde se paga, e bem, num ginásio para andar ou correr num tapete e se pega no carro para nos deslocarmos os oitocentos me-tros que distam da nossa casa a imensos sítios onde temos de ir regularmente.
Vivemos num mundo onde é raro quem saiba o que é ver e cheirar uma alvorada no campo.
Vivemos num mundo onde é raro quem sinta, cheire e saboreie, sim saboreie, uma maresia no inverno, de preferência com os pés na água.
Vivemos num mundo onde é fácil dar um raspanete a alguém mas é difícil ter palavras meigas.
Vivemos num mundo onde se chora, ou não se dá, uma moeda a um pobre mesmo que seja dissimulado e se gasta dinheiro todos os dias nas coisas mais inúteis.
Vivemos num mundo onde choramos os eurozitos que pagamos num excelente hospital onde fomos tratados como príncipes e não nos lembramos que cerca de oitenta por cento da população mundial nem sequer tem acesso à medicação mais primária.
Não sou nada a favor da máxima “pobrete mas alegrete” que tanto jeito dá a regimes totalitários como foi o nosso caso no passado, mas entendo cada vez mais as gargalhadas genuínas de pessoas simples que vivem com pouco, em contraponto às que passam a vida nas cadeiras dos psicanalistas a contarem as mágoas do dia-a-dia com uma conta choruda no banco.
 

Bom Natal para todos
Até um dia destes.