EDITORIAL


Armindo Veloso
 

Pó como nós

Há tempos atrás vi uma entrevista na RTP1 feita por Fátima Campos Ferreira a Adriano Moreira quando ele fez 90 anos.
Foi uma excelente entrevista tanto do lado da jornalista, perguntas atempadas e serenas encadeadas com lógica na forma e no tempo, como do lado de Adriano Moreira, com respostas claras e sábias.
São os tais documentos que todos nós deveríamos ver e ouvir porque nos ajudam a meditar.
Numa fase, talvez a mais pesada da entrevista, Adriano Moreira disse que quando Salazar morreu ele não estava no país. Logo que chegou, no final desse dia, já quase noite, foi prestar-lhe homenagem. Quando, na igreja, em silêncio, meditava junto do cadáver, reparou que estava pousada uma mosca na boca do então todo poderoso António Oliveira Salazar.
Aquele momento, continuou Adriano Moreira, foi chocante porque tive um pensamento que até hoje jámais esqueci: para que serve ter tanto poder na  terra?
Esta descrição feita por um sábio, Adriano Moreira é-o, com 90 anos dão um cunho muito especial a estas palavras. Também não as esquecerei.
Não nos podemos andar a deprimir sistematicamente. Se assim fosse, a vida não teria interesse nenhum. Mas, devemos meditar muitas vezes neste tipo de coisas para não nos armarmos em pavões. Afinal, sendo Salazar, Estadista, ou salazar de rapar as formas dos bolos, a coisa vai, no fim da linha, resultar no mesmo: Pó.

Até um dia destes.