EDITORIAL


Armindo Veloso


Historinhas

Uma pessoa de quem eu gosto contava-me há dias um pouco da sua história de vida.
Disse-me ele que aos seis anos foi servir para um lavrador. Escusado será explicar o que quer dizer a palavra ‘servir’.
Aos 12 foi para Lisboa trabalhar para um restaurante no Cais do Sodré onde fazia, como é fácil de adivinhar, as tarefas mais básicas.
Dezasseis meses depois, e sem ganhar cheta, servia sopas ao balcão que eram distribuídas do outro lado pelo patrão.
Certo dia, o patrão, como de costume, pediu-lhe uma sopa para um cliente. Depois de a pôr onde sempre as punha, no balcão, o patrão deixou-se ficar a conversar com outro cliente e quando foi servir a sopa ela estava fria. A culpa foi do empregado dele, claro. Depois de pôr uma segunda  sopa, quentinha, no balcão, as coisas passaram-se a papel químico. Aí o patrão desancou-o. Só que, o rapazito, ele, foi buscar a dignidade que tinha, e tem, e pregou com a sopa nas trombas do patrão.
- E eu, ala que se faz tarde...
Fugiu para um outro restaurante de um senhor que entretanto conhecera. Pessoa de outras entranhas, acolheu-o e deu-lhe trabalho pelo qual lhe pagava 600 escudos por mês. Um advogado, cliente desse restaurante, prontificou-se a fazer valer os seus direitos no primeiro. Foi-lhe dito que o trabalho de 16 meses ficava para os pratos que o rapaz partiu.
Hoje esse senhor tem uma família e uma vida lindíssimas em França.
Esta historinha, a par de milhões parecidas com esta, faz-nos bem ouvi-las para relativizarmos certas crises...
Até um dia destes.