EDITORIAL

Armindo Veloso



Coisas sérias

Quando Portugal entrou para a CEE, hoje União Europeia, sujeitou-se, sem mais, às regras comunitárias, como sempre comandadas pelas grandes economias com a Alemanha e França à cabeça, de uma forma muito precipitada.
Com a entrada na UE recebemos quadros comunitários atrás de quadros comunitários, que deram uma ideia (hoje verifica-se em grande medida ilusória), de regabofe, a Europa, directório, mandou-nos abater grande parte da frota pesqueira, em troca de dinheiro; acabar com grande parte da nossa agricultura, em troca de dinheiro; e acabar com quase toda a nossa indústria transformadora, mais uma vez em troca de dinheiro.
E agora? Agora, endividados até às orelhas e a precisarmos do dinheiro deles ou da sua influência, há que cumprir mansos e quedos.
Há dias atrás, ouvi umas declarações inflamadas de Pedro Nuno Santos, vice-presidente da bancada parlamentar do PS. Dizia ele que se a Alemanha continuar a impor-nos o garrote, expressão minha, devemos dizer-lhes que não pagamos a dívida e que dessa forma “as pernas dos banqueiros alemães até tremiam”.
Este senhor tem obrigação de saber que por erros passados, alguns enumerados atrás, nós somos um país completamente dependente do exterior.
Falando só da alimentação: Saberá Pedro Santos que se nós ameaçássemos não pagar a dívida a partir daquele segundo não haveria mais empréstimos? Consequência? Ah, só esta, a partir daí tínhamos de pagar as importações à vista, a dinheirinho, mesmo os produtos de primeira necessidade como as farinhas, por exemplo. Quando os “tostões” terminassem as prateleiras dos supermercados ficariam vazias. Nesse caso, esperávamos todos que a despensa do Nuno Santos tivesse muitos víveres.
Já vi supermercados com as prateleiras todas vazias em Cuba. Muitos não imaginam a sensação que é.
O melhor é não brincarmos com coisas sérias.

Numa conferência dada numa universidade, Fernando Birri, cineasta argentino, foi interpelado por um aluno que lhe perguntou para que serve a utopia.
Depois de uns segundos de silêncio, Birri respondeu que a utopia está no horizonte. Cada dez passos que dermos na sua direcção ela afasta-se de nós outros tantos.
Então para que serve? Serve exactamente para isso, para caminhar.
Caminhemos em direcção ao horizonte da paz e da fraternidade entre todos os seres humanos.

BOM ANO NOVO, mesmo!
Até um dia destes.