Editorial

Armindo Veloso



Ideias e Execuções

O Jorge é um alentejano profundo com cinquenta e tal anos. Nasceu e mora em Ferreira do Alentejo e vive um dia de cada vez entre os seus cães, os seus borregos e a sua caça.
Entre torresmos, migas e açorda alentejana, regadas com vinho da terra, conta coisas que para um minhoto nascido e criado entre uma e outra leira, uma e outra casa ora amarela ora roxa, são sempre a estrear.
No baixo Alentejo, interior, as pessoas e o seu modo de vida são completamente diferentes dos nossos. Aqui sim, o termo mouro é apropriado. Aquelas gentes estão em sintonia perfeita com as suas aldeias e vilas mouriscas.
Numa conversa entre torresmos e um copo dizia-me o Jorge, que é comunista desiludido: - fomos nós, comunistas, que demos cabo da reforma agrária. A reforma agrária começou como uma libertação de quem trabalhava de sol a sol para o agrário, ausente, normalmente em Lisboa, vir cá buscar os proveitos do seu latifúndio. Só que, continuava o Jorge, nós, quando se formaram as cooperativas tão necessárias, achámos que todos tinham de trabalhar de forma igual e foi aí que nasceram os problemas. Quando se impunha que constituíssemos equipas coesas com missões diferentes a tanger para o mesmo fim, não o fizemos. Em vez disso, julgávamos que todos tinham que trabalhar nas mesmas tarefas de campo e que todos tinham de definir estratégias e gerir. Dessa forma a anarquia instalou-se e deitou por terra a reforma que os alentejanos mais ambicionavam.
O resultado foi este, insistia o Jorge, nós não fomos capazes e os agrários abandonaram na primeira fase as suas herdades e, na segunda, a que vivemos, venderam as terras aos espanhóis para coutos de caça ou para olival.
Agora digo eu, foi assim que morreu o celeiro do Alentejo.
Como nós somos! Com o sentimento de inveja à flor da pele, deitamos por terra excelentes ideias.

Até um dia destes.