EDITORIAL



Armindo Veloso




A ERA DOS MERCENÁRIOS

Os cinquentões, como eu, fazem parte de uma geração, a mais jovem para o que me traz cá, que se lembra bem do “amor à camisola”. Os mais novos já não sabem o que isso é. E esse amor à camisola não se resume ao futebol e a outros desportos. Vejamos.
No futebol, dantes também havia transferências de jogadores mas a grande parte jogava com amor à camisola. Mesmo nos grandes como o Benfica, Porto e Sporting respirava-se uma mística que ultrapassava em muito o dinheiro que ganhavam, nessa altura muito menos. Hoje, os jogadores estão num clube, mudam para o seu rival, e dizem, o que lhes mandam dizer, até ao ponto de confessarem que, lá no fundo, são desse clube desde pequeninos.
São os mercenários do futebol.
Na gestão de empresas, embora o termo gestor seja recente – havia o patrão e os empregados, quando muito existia o “bufo” do patrão que, por esse facto, tinha mais acesso à graxa e ao pano do pó do todo poderoso que de vez em quando lhe dava uma esmolita —, há alguns anos, o gestor de uma determinada empresa vivia-a com o coração.
Nos dias de hoje, defendem quem lhes paga, como diz um amigo meu gestor de um grande grupo económico. É legitimo. Mas, esse tipo de gestor só gere com a razão. Falta-lhe a emoção.
Que felizes são aqueles que podem juntar os dois sentimentos. Se se gerir com pragmatismo e com amor à empresa fazem-se coisas que de outra forma nem passariam pela cabeça.
Aqueles, são os mercenários da gestão, moderna.
Na política, por muito mal que alguns tenham feito, refiro-me até a ditadores, no passado, quem dedicava a sua vida à política, vivia-a com emoção e até com devoção. O interesse próprio e dos seus era relegado para segundo plano. Hoje, a maioria dos políticos desempenham essas tarefas, nobres, pelo seu interesse e pelo interesse do seu grupo de apaniguados.
Como justificar que, por exemplo em Portugal, os dois líderes do PS e do PSD não se reúnam e decidam fazer o que é necessário ser feito, e os dois sabem que é, para tirar Portugal de uma situação dramática que muitos ainda não levam a sério?
Será que os dois estão à espera de serem transformados em rapazes dos pregos do Fundo Monetário Internacional?
Não seria melhor entenderem-se e explicarem ao povo, em conferência de imprensa conjunta, o que se passa com as nossas contas públicas para que se entenda, de uma vez por todas, que temos, todos , à medida de cada um, fazer sacrifícios acrescidos?
Os líderes políticos, salvo honrosas excepções, são os mercenários da política.
O problema meus caros, é que a história conta-nos que só algumas batalhas foram ganhas com este tipo de soldados. Não me consta, no entanto, que tenham ganho alguma guerra!
Até um dia destes.

P.S. — Este texto foi escrito antes das medidas recentes tomadas pelo governo. Não mexi uma palavra. Infelizmente, na minha opinião, ainda se mantem actual, todo.